terça-feira, 29 de março de 2011

DESENCONTROS


Não sei se cheguei tarde
Ou se foi cedo demais
Pra oferecer uma canção
Lançar meus jogos mortais

Sob o meu corpo
Só uma sombra
E o teu cheiro
No meu jardim

Em pratos rasos
As tuas sobras
No coração
A dor que dói sem fim

Entalhei na minha pele
Sua expressão indiferente
Para poder me convencer
Que para sempre será ausente

Fecho meus olhos
Apago sonhos
Calo a angústia
Do meu viver

Tranco o silêncio
Versos componho
Cuspo palavras
Pra não sofrer

Já troquei as fechaduras
Pra ninguém mais poder entrar
Já me vesti com armaduras
Para poder te esperar

Embalo a dor
Com o seu canto
Na esperança
De adormecer
Curo a saudade
Com o meu pranto
Sufoco o amor
No meu louco querer

Não sei se cheguei tarde
Pra declarar o meu amor
Vou esperar por mais um dia
Esperar até o sol se por

Má Antunes, 27/03/2011.

SABORES


Tua ausência
Tange a maldade
Que atiça meu paladar

Saudade
Tempera tua carne
Saboreio,
Gosto picante
De estrelas cadentes
Salpicando em meu colo
Espinhos ferinos
Correndo em minha pele
Ardente, quente,
Cortante

No sal do teu corpo
Salivo,
Feito loba no cio

Da ausência, o fel
Apago,
Com beijos salgados
Rejeito esse amargo
Degustando teu céu

O acre da partida,
Mato,
Com doce de festa
Doce do gozo
No doce sabor das palavras
Aquelas que você não diz
Quando tua boca silente
Se cala na minha

Na mistura de gostos
Me farto
Cometo
O pecado da gula

Má Antunes, 11/03/2011

terça-feira, 1 de março de 2011

O ÚLTIMO "KUARUP"

   Foto de Renato Soares



Em sonhos livres de amor pelo sertão
E nas mãos carregando um grande fardo
Uniram-se os três grandes irmãos
Villas Bôas: Orlando, Cláudio e Leonardo

No desbravo de territórios em branco
Marcados pelo mapa do Brasil
Marcharam para o oeste em firme bando
Bravos guerreiros em ato tão servil

Através da Fundação Brasil Central
Que Expedição Roncador-Xingu se fez
Qual criou o Governo Federal
Em 1943

Um quartenário durou essa história
Que só Rondon foi capaz de tal façanha
Contou Darcy Ribeiro em suas memórias
“Vidas belas jamais se viu tamanha!”

Em ousadas aventuras se lançaram
Por matas e campos indevassados
Pelos rios e em aldeias se embrenharam
A procura de índios intocados

Em 2002, no início do verão
Partiu o último deixando seu legado
Aos índios: respeito, amor e preservação
Herança de Orlando, Cláudio e Leonardo

No Alto Xingu, em 2003, tribos infantes
Os “caraíbas” receberam em honraria
Índios vindos de áreas tão distantes
Pra cerimônia sem a qual não ficaria

E na aldeia Yawalapiti de reuniram
Pr’o “Ultimo Kuarup” em celebração
Num ritual para aqueles que partiram
Deixando ao mundo esta tão grande lição

Poema baseado e inspirado no texto “A Marcha para o Oeste” do fotógrafo e documentarista Renato Soares e composto em homenagem aos irmãos Villas Bôas e aos cinqüenta anos da criação do Parque Indígena do Xingu.

Má Antunes, 23/02/2011.