segunda-feira, 16 de setembro de 2013

DISCORDÂNCIAS


Depois de muitas análises sintáticas
De todo nosso contexto
Resolvi dar um zero
Para a nossa construção literária.

Percebi que meus adjetivos
Não combinam
Com o seu substantivo.

Nossos verbos
Não concordam.

Que eu
Sou uma dissertação científica
E você
Uma ficção literária
Que nem me serve de autoajuda.

Cansei das suas metáforas
E semânticas

Sua linguagem
É coloquial demais
Para as minhas formalidades.

Nossos advérbios
Não ficam mais
Adjuntos.

Você
É um agente muito passivo
Na minha oração
E não me complementa mais
Nominalmente.
Virou um sujeito oculto
E eu
Te queria como um objeto direto

Nossos momentos
Estavam sempre entre parênteses.

Havia muitas vírgulas
Reticências e etc.
E poucos gerúndios.

Quando te vejo
Já não sinto mais exclamações.

E depois de muitas interrogações
Resolvi fechar aspas
E colocar um ponto final
Nas nossas discordâncias.

Má Antunes, 16/09/13.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

ENTREGA


A castidade em que me guardo 
É o fogo que te consome
E faz arder em tuas veias
O desejo pecaminoso
De acordar meus demônios
E o sonho
De adormecer em meu colo 

À distância sigo teus passos
E sem perder o compasso, 
Equilibramos na corda bamba 
Da linha do tempo.

E a vida pende
Entre a loucura de viver incertezas
E a solidez de uma realidade morta

Mas não fecho essa porta
Abro os braços para um salto mortal
Atirando minha escassez
No poço dos teus desejos
Ávida apenas por um beijo
E pouso suave toda minha espera
Na voracidade da tua fome
Tornando-nos uno de alma e de carne
Tornando-nos
Um alguém que não tem nome


Má Antunes, 03/07/2013.

terça-feira, 2 de julho de 2013

ÚLTIMO DESEJO


Vou afogar-te
No “cale-se” da minha boca
De não mais beber teu nome
Em gotas de sengue
Até sentir em meu peito
Teu último suspiro
E a súplica do último desejo
De viver para sempre
Em meu silêncio.

Má Antunes, 02/07/2013

sábado, 29 de junho de 2013

PROGNÓSTICO


Doutor, não me diga
Quanto tempo
Ainda tenho de vida
O pouco que tive
Já foi muito sofrida
Sei que não vim
Só com passagem de ida
A volta é certeira
Cedo ou tarde
Tenho que achar a saída

E o que vai me levar
Não é essa ferida
Vai ser a maldita
Paixão não retribuída
Essa sim
Dói feito mordida
Me consome dia após dia
Apressando minha partida
E quando penso que passou
Aí vem a recaída
Não tem jeito, não tem cura
Faz de mim um suicida

Por isso, Doutor,
Por favor, não me diga
Quanto tempo
Ainda tenho de vida.


Má Antunes, 29/06/13

sexta-feira, 1 de março de 2013

CANOA


Tem dias que amanheço canoa
Vago sem rumo,
Navego à deriva
Fico à toa

Tem dias que amanheço canoa
Ora sou mar,
Ora sou rio
Ora lagoa

Tem dias que amanheço canoa
Buscando seu porto
E dos meus olhos
A tristeza me escoa

Tem dias que amanheço canoa
Abandonada no tempo
Esquecida ao vento
Vivo sob a garoa

Tem dias que amanheço canoa
Distraindo a paisagem
Atenta ao canto
Que o pássaro entoa

Tem dias que amanheço canoa
Chamando seu nome
Ouço apenas meu grito
Que perdido ecoa

Tem dias que amanheço canoa
Sigo em frente
Deixo a via pra trás
Por mais que me doa

Má Antunes, 01/03/2013