domingo, 3 de outubro de 2010

A ESPIÃ


          Uma longa distância pela frente e um cansaço arrebatador de uma ainda segunda-feira de trabalho. Busco a companhia agradável do rádio para manter mina atenção e mandar o sono para bem longe.
         Mesmo entretida com a música e com a solidão da estrada, percebo que era observada. Discretamente, sem tirar meu foco da pista, constato que ela está ali, a me flertar toda cheia de si e sem o menor pudor.
         Acanhada, tento disfarçar tateando minha bolsa a procura de uma guloseima que sequer ofereci a ela. Mas ela não se intimida, continua ali, emparelhada comigo, lado a lado, como se fossemos companheiras de viagem.
         Às vezes se escondia, e quando pensava ter me livrado daquela atrevida, aparecia toda prata radiante e faceira.
         Tomei coragem e arrisquei uma prosa. Mas ela, por orgulho ou timidez, não me deu uma palavra sequer, apenas me observava.
         Quando constatei que era batalha perdida, rendi-me ao olhar indiscreto daquela que me vela todas as noites, e permiti que guiasse meu caminho com sua luz me conduzindo de volta para casa.

        Má Antunes, 29/04/10.

Nenhum comentário:

Postar um comentário