Uma bela manhã de sol e ventos soprando a favor. Era tudo o que ela precisava para realizar seu sonho: dar seu primeiro salto de asa-delta sozinha. Tinha se preparado meses para esse momento. Então seria hoje o dia do triunfo.
Acordou cedo, pois quase não dormiu na noite anterior. Arrumou-se para um dia de festa. Verificou se tudo estava em ordem no apartamento. Olhou ternamente por alguns minutos a foto da família sobre a mesa de canto. Beijou a foto e colocou no mesmo lugar como se nunca tivesse sido mexida.
Havia combinado com seus amigos de vir buscá-la, assim não precisaria tirar o carro da garagem. O porteiro interfona anunciando a chegada deles. Antes de fechar a porta da sacada aprecia aquela tão privilegiada vista para o mar. Abastece de ração a vasilha do gato e desliza sua mão suavemente sobre seu pelo. Sai saltitante feito criança em direção ao parque de diversões.
Já no carro pede para seus amigos fazerem o percurso pela orla, assim poderia ir tomando aquela maresia fresca da manhã. O percurso não é longo, mas o suficiente para rever toda sua vida. Aquele era um dia especial, o dia em que se livraria de suas amarras.
Chegando ao alto da pedra faz cuidadosamente a checagem de todo equipamento. Revê com seu instrutor todas as estratégias de vôo, afinal nada poderia dar errado. O dia estava propício para um vôo perfeito.
Abraça seus amigos num gesto de comemoração como nunca os havia abraçado antes. Pede para um deles gravar um vídeo com seu depoimento do quanto aquele dia era importante para ela. “Morreria feliz caso algo saísse errado”, foram suas últimas palavras no vídeo.
Olhou para o sol e abriu os braços como um filhote de águia pendendo as asas em seu primeiro vôo para fora do ninho. Sentiu o vento em seu rosto, respirou fundo, tomou impulso e lançou-se em seu planar em direção ao universo.
Mas espere! Ela pulou sem a asa-delta!
Má, 08/06/2010.
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